quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Sentiu-se em casa...

...quando aterrou no leito dele. Cheirou a um regresso a partes dela que já tinham partido há algum tempo. Há muito tempo.

Aonde está ele?

A casa ainda cheirava à colónia que borrifava todas as manhãs antes de sair porta fora para a rotina diária. À noite tinha o costume de deixar as chaves da casa ao lado dos perfumes para não se esquecer deles antes de sair.

Mas,naquela tarde, o odor desenhava um percurso que se repetia do quarto até à sala e da sala até ao quarto até terminar na porta de saída.

Maria estranhou o desenho...tinha em si a sensação fria de que aquele percurso tinha sido trapalhão.

A colónia fazia dançar pela casa uma melodia que Maria mal conseguia ouvir. Com calma, e tentando esquecer o que o seu sexto sentido lhe gritava, foi desfazendo as malas.
Ao abrir a primeira gaveta, espantou-se ao ver que estava vazia. Então abriu outra, e outra, e outra... e as portas do roupeiro...

Vazio!

Estava tudo vazio!

Mas aonde está ele? - repetia.

O quarto despido começou a parecer cada vez mais pequeno e Maria sentiu-se a ser engolida pela vida.

Faltava-lhe o ar e o espaço.

As pernas tremiam sem forças e o estômago dava nós sobre si mesmo. Acabou por se deixar cair até ficar sentada no chão!

Quando, finalmente, ouviu o que lhe era gritado, o seu coração apertado explodiu em forma de pontada forte no peito.

Pelos olhos jorrou um mar salgado em fúria e pela boca o silêncio de dois lábios que se apertaram demais para nada deixarem sair. Pelos ouvidos entrava a bom som a melodia que continuava a ser tocada.

E a colónia bailava...




segunda-feira, 5 de setembro de 2011

E eu sei...

E eu sei que não te quero! E eu digo a mim mesma, vezes e vezes sem conta, que não és tu.
E eu fecho e encerro e escondo...e eu fujo de ti, não sabias?

E é o teu toque que me engana! Que me segura no momento. Que paralisa cada célula do meu corpo que já estava de partida.
Enquanto os toques se multiplicam, se geram e reproduzem, eu estou ali...

E é a vontade de sentir o que há muito já não sinto que me agonia. Porque quando as nossas mãos se desencontram, e nenhuma parte do meu corpo repousa no teu, o que eu sinto é que pouco senti.
E o teu olhar sorridente corta-me de fininho...

Corro para mim mesma, quão depressa consigo, baralho as passadas e desço por mim aos trambolhões. Quando paro, engulo a lágrima que ameaça rebentar e respiro de alívio por estar sozinha.

E é frustrante!! E é irónico. Assim que me levanto e recomponho, assombra-me o pensamento, e a alma, a vontade de regressar a ti.

E eu já não sei o que é. E já me cansa tentar perceber...

E eu fecho e encerro e escondo...e correndo para ti, eu fujo de mim!

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A neve...

A neve precipitou-se para o cume daquela montanha sorrateira e suavemente. Quando olhei a paisagem já o branco se tinha apoderado das outras cores. Gelou! A vida que ali se sentia pairava no tempo, como quem, hirto e imóvel, vê os barcos passarem!

Eu olhava para aquele manto pesado, que num breve desvio do meu olhar e da minha atenção se tinha depositado, e na minha cabeça, ensurdecendo a minha mente, a minha voz não se calava. Farta de ouvir as mesmas lengalengas que desde há muito, já nem me lembro desde quando, conto a mim mesma, virei costas àquela vida estagnada e deixei que deste outro lado, para onde agora olhava, a vida fosse suficiente para apagar o que atrás de mim, hirto e imóvel, se levantava.

Suficiente nunca foi, pelo menos para quem me visitou! O que à minha frente se oferecia não chegava, era pouco.

E mentia a mim mesma, aquela voz que não se calava repetia que eu queria isso...pouco ou nada!







terça-feira, 24 de maio de 2011

O mar revoltava-se...

...ao longe como tropa de uma guerra sem inimigo. As ondas que me chegavam aos pés, de tanta raiva que tinham na força, obrigavam-me a passo e meio na direcção que seguiam. A brisa intensa envolvia os meus cabelos numa dança tribal e a vontade de entrar nesse remoínho de forças despertou em mim. Vi nesse mar todas as lágrimas que não tenho deixado sair...estremeceu o meu peito com a marcha desses soldados, estremeci eu...
estremeceu a minha Alma com esse passo agitado...era mais forte do que eu.

Mais passo e meio e a guerra agarrou-me pela cintura. Relembrou-me do teu abraço...que me segurava sempre que algo em mim fugia; a força, a vontade...a alegria! Mas este abraço queria-me levar, queria que eu não resistisse...levava consigo a areia onde os meus pés se enterravam, queria-me ver tombar.

O palpitar do meu peito também me empurrava para a frente...e o turbilhão já quase não me deixava respirar.

Cedo cedi à emoção... e escorreu-me pelos olhos a outra metade desse mar.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Pela Janela...

...escorria a chuva daquele dia de Inverno. A par e passo com as suas lágrimas,desfocava a paisagem. Não sendo a paisagem o que ele via naquele momento, o cenário esbatido calhava bem.
A nostalgia passava-lhe imagens passadas como um grande projector...fotografias e películas de momentos arquivados...ou talvez não!
Segurava a chávena de chá fria sentado na cadeira de baloiço; já estava naquele cliché há algumas horas.

Quando acordou de manhã soube que o dia seria assim. Faltaram-lhe as forças para sair da cama e rendeu-se a mais algumas horas de sono forçado. Já não luta contra a maré! Arrastou-se da cama já a meio do dia, virou a cadeira para a janela, enrolou-se numa manta, meteu a água a ferver e deixou o dia frio e cinzento fazer o resto!

Não é conformista, não tem pena de si mesmo e não está irremediavelmente deprimido! Não sente prazer na dor e no sofrimento, não está preso à melancolia! Faz tudo o que está ao seu alcance para que o dia o empurre tão para baixo quanto possível. Não luta, deixa-se escorregar pelas imagens projectadas para dentro de si.
Não está irremediavelmente deprimido...quer bater no fundo, chorar até secar...porque amanhã já não vai ser assim!

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Palavras para quê...

Já não as tens! Procuraste ao longo destes anos, dentro de ti, por todos os sentimentos que conseguias transformar em nomes; esgotaste os arredores do coração e acabaste por rompê-lo com a força da urgência. Querias palavras que levassem com elas um bocado de ti.

O seu ar sereno sempre denunciou o teu insucesso. Se por dentro o teu coração rompia, caiu apenas dentro de ti o que nele se agitava!

As palavras com que ele te agarrava não coadunavam com o seu abraço! E quando os abraços se foram esquecendo...as palavras nunca mais se lembraram de ti!

Na esperança de que ele fosse tão alienado quanto alguém pode ser, convenceste-te de que talvez nem todos soubessem amar!

Quem te via nessa busca interminável não percebia a que parte da tua tamanha fraqueza ias buscar tanta força!

Ninguém nunca soube amar como tu!